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terça-feira, 15 de janeiro de 2008

Contos de fadas

Passamos a infância inteira lendo e ouvindo contos de fadas. Estorinhas fofas e frufrus com princesas lindas e bondosas que encontram seus príncipes encantados, casam-se e são felizes para sempre. Ahã. Mas convém não prestar lá muita atenção. Senão vejamos:

- Cinderela sofre feito um cão. Fica órfã, a madrasta a maltrata e toma para si todos os bens da família. Daí a fada madrinha a ajuda, ela vai ao baile, o príncipe e ela se apaixonam. No dia seguinte o príncipe a identifica pelo sapatinho de cristal, eles se casam e são felizes para sempre.
Mensagem: não lute pelos seus direitos, espere somente pela justiça divina. Aliás, não se preocupe em fazer um testamento que proteja seus filhos. A sorte cuida disso. E, ser identificada pelo número do sapato! Francamente. Pior que isso só se o príncipe a identificasse pela arcada dentária!

- A Bela Adormecida foi amaldiçoada por uma bruxa malvada que não havia sido convidada para sua festa de batizado. Uma fada amenizou a maldição: a princesa ficaria somente adormecida até que um beijo de amor verdadeiro a despertasse. O príncipe veio, a beijou, eles se casaram e foram felizes para sempre.
Mensagem: se o cara te salvou, nada importa: case-se com ele. E preste sempre muita atenção na lista de convidados.

- A Pequena Sereia desafia seu pai, abre mão de sua cauda para se tornar humana e poder ficar perto do príncipe. O príncipe se apaixona por ela e, após alguns percalços eles se casam e são felizes para sempre.
Mensagem: seus pais não sabem de nada e abrir mão de sua identidade é uma ótima idéia. O importante é casar. (olha o perigo....)

- Branca de Neve foi uma precursora da Cinderela. O pai também não se preocupou com o destino dela, que caiu nas garras de uma madrasta que de quebra era bruxa e malvada e quis matá-la por inveja. É pouco? Pois quando a madrasta conseguiu que ela fosse dada como morta, após 3 tentativas, os anões a colocam num caixão de vidro (coisa mórbida...). Um príncipe a vê, se encanta por ela, a beija, quebra o encanto e ela acorda. Daí eles se casam e são felizes para sempre.
Mensagem: confiar cegamente nos outros é legal. E príncipe necrófilo ainda assim é príncipe e tá valendo. O importante é casar.

E por aí vai. Tudo se resume a casar. Não importa que o príncipe seja tão desatento que só reconheça seu amor pelo número do sapato. Ou seja necrófilo. Ou que você precise abrir mão de quem você é. É assustador pensar que todo mundo recebe estas mensagens durante a infância. Talvez isso explique porque o mundo anda do jeito que está.
Mas também não acho que seja o caso de privar as crianças dos contos de fadas. Eles têm sua importância e eu estou exagerando, é claro. Só penso que, vez por outra, seria bom introduzir uma estória nova, atualizada. Uma princesa que se preocupe com outras questões além do amor eterno. Uma princesa que proponha se casar mais tarde, após concluir os estudos. Uma princesa que saiba se defender e lutar por seus direitos.
Eu, particularmente gosto da versão que eu creio ser a original da Pequena Sereia. Nela, a sereia troca a cauda por pernas, não somente pelo príncipe, mas por desejar ser humana e ter uma alma imortal. Mas nada dá certo. O príncipe se casa com uma outra princesa e a sereiazinha morre, sem ter conquistado sua alma. Triste. Mas ao menos mostra que devemos respeitar nossa própria natureza.

2 comentários:

Unknown disse...

Seu último parágrafo está correto, pois essa é a versão original da Pequena Sereia. Só um adendo, que não sei dizer se realmente é parte da versão original ou se é um acréscimo feito a posteriori: depois de morrer, dissolvendo-se em espuma nas águas do mar, a sereia acaba acordando transformada numa espécie de "fada do ar" (uma espécie de entidade etérea), e encontra outras como ela, que a informam que deve visitar as crianças, zelando pelo seu bom comportamento e crescimento, até que chegue o dia de ganharem uma alma imortal. Toda vez que uma criança desobedecesse seus pais, seria acrescentado um dia ao tempo de espera para que as tais "fadas do ar" conquistassem sua alma.
Ou seja, tudo terminava com uma mensagem do tipo "seja bonzinho e obedeça ao papai e à mamãe", que você vai crescer bem e protegido dos perigos, e de quebra vai fazer uma sereia conquistar sua alma.
Ah, só mais um detalhe. Na história original, ao contrário da versão Disney, a sereia ganha pernas, mas não sem pagar um preço terrível: teve a língua cortada (e não a voz magicamente roubada), e quando caminhasse sentiria dores horríveis, como se pisasse em punhais. Sinistro!

Anônimo disse...

Verdade! Tinha esquecido destes detalhes. A estória original é muito melhor. Lembro de ficar com muita dó da sereia, sentindo dores excruciantes a cada passo.