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domingo, 19 de agosto de 2012

Valente - um filme em camadas e o espírito feminino



Contém spoiler!

Amo a Pixar. Amo Toy Story. Amei Valente.
Acho incrível essa capacidade de contar várias histórias em uma só. É mais do que aquela velha constatação de que cada pessoa faz sua própria leitura de um livro ou filme, baseada em seu próprio "repertório" emocional. Antes, é a habilidade de contar histórias diferentes e, assim, tocar todos os públicos. Veja Toy Story 3, por exemplo.
Quando eu estava planejando levar minha filha para vê-lo no cinema, uma amiga me aconselhou a não levá-la. Disse que era muito triste e que ela tinha ficado meio "mexida"  por um bom tempo. Outros amigos disseram ter gostado muito, e que era muito comovente. Já as crianças diziam que era muito divertido e engraçado. E quando enfim consegui assistir o filme, com minha filha, entendi o que aconteceu. Ao final, Isabella tinha curtido o filme, rido bastante e estava muito contente. Eu, estava chorando. Não achei o filme triste, sou do time que achou comovente, mas compreendo minha amiga que viu tristeza.
Toy Story 3 é um filme em camadas. Numa primeira camada, mais superficial, que é "acessada" pelas crianças, é um filme divertido sobre brinquedos em busca de seu dono e que acabam encontrando um novo lar. Numa camada mais profunda, acessada pelos adultos, é um filme sobre obsolescência, velhice, abandono e morte. Assuntos sensíveis e dolorosos, em maior ou menor grau, a todos os adultos.
*
E daí tem Valente.

No geral, o que se fala deste filme é que ele é o primeiro filme da Pixar que tem uma protagonista feminina. Merida, a princesa de cabelos de fogo, é a primeira princesa da Pixar. Merida, é a primeira princesa sem príncipe. E isso é tudo.

Mas, novamente, e felizmente, minha filha e eu assistimos a filmes diferentes. Ela, viu um filme sobre uma princesa corajosa que não quer se casar, faz trapalhadas e acaba tendo que salvar sua família. Eu, vi um filme sobre os meandros da relação entre mãe e filha e sobre a essência selvagem feminina.
A rainha Elinor, mãe de Merida, é a rainha sábia, sensata e culta, que exala autoridade e impõe respeito. Aparentemente foi talhada para ser rainha e está sempre perfeita. Cabelos e roupas em perfeita ordem, a palavra certa nos lábios e a atitude correta sempre. Ela educa Merida para ser como ela: a rainha perfeita. Mas Merida... ela é o completo oposto de Elinor. Impulsiva, expansiva, física, tem espírito livre como um animal selvagem, maravilhosamente personificado em seus lindos cabelos vermelhos como fogo e rebeldes como a dona, cheio de cachos indomáveis.
Elinor educa Merida como ela própria foi educada, para ter o mesmo destino que ela teve. Merida entende que sua mãe quer ela seja como ela. Elinor se recusa a ouvir Merida e a compreender seus motivos. Merida se rebela contra as ordens de Elinor. Elas brigam e Merida pede a uma bruxa que mude sua mãe. Quando a mãe se transforma num urso, Merida vê a bobagem que fez e faz de tudo para salvá-la. Elas se aproximam, entendem enfim o mundo da outra e se salvam mutuamente. Que mulher nunca viveu esta situação com sua mãe ou filha?

Ao mesmo tempo, Elinor e Merida são 2 partes da alma feminina. Percebi isso logo no começo, quando Merida, feliz em seu dia livre, livre das atribuições de princesa, salta sobre seu cavalo em pelo e, correndo pela estrada, vai atirando flechas certeiras em alvos distribuídos pelas árvores. Depois, ela escala uma rocha altíssima, quase vertical e bebe água de uma cachoeira inacessível. Ela é confiante. Ela é destemida. Ela está completamente feliz consigo mesma. Ela é a essência selvagem, o instinto, o ímpeto, a coragem, a liberdade. E me peguei pensando porque esta cena mexeu tanto comigo, me deixou tão empolgada. (Porque me deu saudade de mim mesma).

Elinor, é o bom senso que comanda a vida cotidiana. Quem tem obrigações e compromissos tem muito da Elinor. Elinor sabe quem é e sabe seu papel no mundo e sabe o que tem que fazer e faz. Elinor quer fazer o certo e quer o que é certo. Elinor sente que precisa domar Merida, para ser certa. Que mulher nunca viveu este conflito, entre sua essência selvagem e o que é apropriado?
Não sei como os homens e meninos viram o filme, como o entenderam, ou que tipo de filme viram. Será que tem mais uma camada, masculina?

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

a função do mundo é me irritar

Nada no mundo me irrita mais do que ensebação. Nada. E tenho dito. Vamos? Então vamos. Fiquemos? Então fiquemos. Agora, ficar parado no meio do caminho, nem indo nem voltando, me dá gastura.
Acho que isso vem da minha infância. Vamos a praia. Uhu, praia! Eu ficava na espectativa, contando minutos por dias, semanas. Daí, finalmente, chegava o grande dia. O Dia Da Viagem A Praia. Preparativos, bagagem no carro, eu entrava toda feliz, o carro andava e eu me sentia na estrada enfim. Mas, 100m depois, paravamos no posto para abastecer, calibrar pneus, trocar óleo. AAAAAHHHHH..... detesto posto de gasolina até hoje. Posto de gasolina, pit stops e ensebação.
E em dias como hoje, parece que existe um complô do universo para me irritar. Tudo ao meu redor é uma ensebação só. Todas as pessoas lerdas e desorientadas estão na minha frente, no trânsito e na calçada. Na calçadas, elas formam uma barreira que anda a 5m por hora.
Tudo começou de manhã. Minha filha não queria ir a escola hoje. Insisti, lógico e disse que ir a escola não era uma opção. De pirraça, ela comeu o café da manhã em longos 30 minutos. Escovar os dentes, pentear os cabelos e trocar de roupa, mais 30 minutos. Bronca e castigo logo de manhã, dor de cabeça e culpa. Sou uma bruxa.
Durante o dia, a coisa continua.  Todos os problemas precisam ser explicados em mil detalhes irrelevantes. A internet está lenta a rede idem. A cada enter, uma longa espera. A pouca paciência vazando pelos dedos.
Hora do almoço. Vamos almoçar? Vamos, espera só um pouquinho. Odeio esperar só um pouquinho. Mas enquanto espero, vou chamando os colegas para irmos juntos. Vamos? Quem vai? Ninguém responde. Depois de longa espera, colega A vai ao banheiro para se preparar para almoçar. Quando enfim ele volta, prontinho para ir, colegas B, C e D resolvem finalmente pensar em ir almoçar. Almoçar? Vocês vão almoçar?????? (Nãããããoooooo, de onde vc tirou esta idéia??????). Onde vcs vão? Comer o que? Onde fica? Como funciona? Hum..... acho que vou também..... peraí que vou ao banheiro.... Aaaaaahhhhhhhhhh!!!!!!!! Vontade de largar todo mundo e ir sozinha, sem ensebação!
Chego em casa. Vamos pedir uma pizza? Pode ser, td bem. 30 minutos depois: puxa, a pizza ta demorando né? Puxa, ainda não pedi. Irritação nível dicumforça.
Amanhã, venha logo por favor. Sem ensebação!